Oficina sem título número 3 (ética-estética)

PLANO DE UNIDADE DE APRENDIZAGEM: Oficina sem título número 3
Disciplina: Filosofia
Nível de Ensino: Médio.
Problema filosófico: Qual a importância da arte para educação?
Tema da unidade: Construção conceitual a partir de uma ideia de formação ético-estético;
Período de execução do plano: 1 hora e 30 minutos.
Materiais necessários:
  • um papel e uma caneta para cada aluno;
  • uma cópia de cada imagem abaixo;
  • uma cópia de cada poesia abaixo.

Objetivo:
  • Realizar um debate a respeito da importância da arte para a educação;
  • Propor um debate que vá de encontro com a cultura já associada pelos alunos;
  • Proporcionar aos alunos uma construção de conceitos que possibilitem dar conta do problema proposto ;

Introdução rápida à estética a partir de algumas obras, fotografias e poesias.
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Moça com brinco de pérola - Vermer
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Noite estrelada - Van Gogh
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a lavadeira toulouse lautrec
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Picasso - mulheres de Algiers
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Salvador Dali -  A Tentação de Santo Antônio


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Samuel Silva - Redhead Girl



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Bruno Zulian foto Caxias do Sul
Psicologia de um Vencido
Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Produndissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme -- este operário das ruínas --
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!



Posso escrever os versos mais tristes esta noite
Escrever por exemplo:
A noite está fria e tiritam, azuis, os astros à distância
Gira o vento da noite pelo céu e canta
Posso escrever os versos mais tristes esta noite
Eu a quiz e por vezes ela também me quiz
Em noites como esta, apertei-a em meus braços
Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito
Ela me quiz e as vezes eu também a queria
Como não ter amado seus grandes olhos fixos ?
Posso escrever os versos mais lindos esta noite
Pensar que não a tenho
Sentir que já a perdi
Ouvir a noite imensa mais profunda sem ela
E cai o verso na alma como orvalho no trigo
Que importa se não pode o meu amor guardá-la ?
A noite está estrelada e ela não está comigo
Isso é tudo
A distância alguém canta. A distância
Minha alma se exaspera por havê-la perdido
Para tê-la mais perto meu olhar a procura
Meu coração procura-a, ela não está comigo
A mesma noite faz brancas as mesmas árvores
Já não somos os mesmos que antes havíamos sido
Já não a quero, é certo
Porém quanto a queria !
A minha voz no vento ia tocar-lhe o ouvido
De outro. será de outro
Como antes de meus beijos
Sua voz, seu corpo claro, seus olhos infinitos
Já não a quero, é certo,
Porém talvez a queira
Ah ! é tão curto o amor, tão demorado o olvido
Porque em noites como esta
Eu a apertei em meus braços,
Minha alma se exaspera por havê-la perdido
Mesmo que seja a última esta dor que me causa
E estes versos os últimos que eu lhe tenha escrito.
(Pablo Neruda)
Mario Quintana

Do amoroso esquecimento

Eu agora — que desfecho!
Já nem penso mais em ti…
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

Emergência

Quem faz um poema abre uma janela.
Respira, tu que estás numa cela
abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo —
para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado.

Relógio

O mais feroz dos animais domésticos
é o relógio de parede:
conheço um que já devorou
três gerações da minha família.
outra cama _ Bukowski

(Tradução: Pedro Gonzaga)

outra cama
outra mulher

mais cortinas
outro banheiro
outra cozinha

outros olhos
outro cabelo
outros
pés e dedos.

todos à procura.
a busca eterna.

você fica na cama
ela se veste para o trabalho
e você se pergunta o que aconteceu
à última
e à outra antes dela…
é tudo tão confortável —
esse fazer amor
esse dormir juntos
a suave delicadeza…

após ela sair você se levanta e usa
o banheiro dela,
é tudo tão intimidante e estranho.
você retorna para a cama e
dorme mais uma hora.

quando você vai embora é com tristeza
mas você a verá novamente
quer funcione, quer não.

você dirige até a praia e fica sentado
em seu carro. é meio-dia.

— outra cama, outras orelhas, outros
brincos, outras bocas, outros chinelos, outros
vestidos
cores, portas, números de telefone.

você foi, certa vez, suficientemente forte para viver sozinho.
para um homem beirando os sessenta você deveria ser mais
sensato.

você dá a partida no carro e engata a primeira,
pensando, vou telefonar para janie logo que chegar,
não a vejo desde sexta-feira.
30 minutos: Sensibilização - problematização
Dado aos estudantes as imagens acima selecionadas pode se colocar em pauta algumas questões para um debate.
O que entendemos por estética atualmente? Das imagens distribuídas qual delas é bela? O que as dá a “beleza” ou não? Qual delas é mais chocante, ou seja nos desperta algum sentimento? Por que umas nos despertam mais e outras menos? O que é afinal o “belo”?

Após este primeiro debate coloca-se aos alunos as poesias selecionadas. Pode-se pedir para que alguns alunos as declamem. A ideia é que eles tenham contato com obras que não são comuns no seu dia a dia. Logo a poesia e a pintura surgem como grandes oportunidades de uma nova experiência. Das poesias lidas novas questões podem ser levantadas.O que faz uma poesia ser “boa”? O que despertou em vocês versos como o de Augusto dos Anjos? E a de Neruda? Será que duas pessoas podem ser exatamente a mesma “coisa”?

20 minutos: Investigação

Se formos pela etimologia da palavra estética, ela na sua origem (Aisthetiké) quer dizer “perceptível pelos sentidos”. A partir de Baumgarten [1714 - 1762] a palavra tem um uso mais próximo a “aquilo que é agradável e belo”.  

Paideia Grega
A paideia é um conceito designado para uma proposta de formação de um homem grego em todas as suas potencialidades. Seu conceito é muito mais amplo que este dado, mas aqui ele nos serve para mostrar que esta preocupação já aparecia na Grécia Antiga. Nos gregos a palavra Kalon tinha um sentido de bom e belo. Se olharmos na filosofia de Platão e Aristóteles vemos que aquilo que era bom, também era belo e justo. Ou seja agir de modo ético é agir de forma bela, boa e justa. Ou seja, através da paideia se via a finalidade de um homem que era bom, belo e justo.

O que é arte
A arte é compreendida como técnica. Jimenez (2000) explana que a arte para Aristóteles não é autônoma, ela faz parte de um projeto de organização política. Para Aristóteles o homem ao olhar uma mimese a contemplando “aprende e discorre” sobre aquilo que são. Para o autor este é um dos motivos do surgimento da poesia, o outro é de que o homem se identifica com o imitado. Pode-se ter uma compreensão do conceito de arte como técnica, um fazer algo, no livro IV da Poética onde o autor de forma detalhada destaca as contribuições para o estilo da tragédia que com o passar do tempo ganhou novos elementos e variações. A “atualização” de uma obra acaba por influenciar a outra, o que é o caso da tragédia, a epopeia e a comédia.

livro pág. 387 do livro didático (Cotrim e Fernandes) -
Educação estética em Schiller
Schiller propõe uma educação estética junto de uma educação ética. pois o homem, para o filósofo, é movido por dois impulsos o Sensível e o Racional. O Impulso Sensível (ou Material) “parte da existência física do homem ou de sua natureza sensível, ocupando-se em submetê-lo às limitações do tempo e em torna-lo matéria” (SCHILLER, 2002, p.63). Enquanto o Impulso Sensível (ou Formal) “[...] parte da existência absoluta do homem ou de sua natureza racional, e está empenhado em pô-lo em liberdade, levar harmonia à multiplicidade dos fenômenos e afirmar sua pessoa em detrimento de toda alternância do estado.” (SCHILLER, 2002, p. 64).
Através da arte seria possível a união destes dois impulsos fazendo assim o homem chegar à liberdade e, pelo Impulso Lúdico, alcançar o Estado de Jogo. Neste estado, como destaca Hermann (2005), há a experiência estética como um meio para se alcançar uma moral autônoma. Assim, Schiller constrói uma ideia de educação para “aperfeiçoamento moral”.
a estética, para o filósofo, tem duas utilidades: uma indireta, na medida em que é base das ações que, com decisão no patamar do sensível, possuem similaridade com a moral, e outra direta, no patamar da razão transformando as inclinações conforme a moral tanto sobre a sua forma quanto conteúdo.
Schiller aponta a uma ideia de arte ideal, esta deveria servir apenas a necessidade do espírito humano e não ao comércio. A arte não poderia ser feita por necessidade de uma demanda de mercado. Seu propósito é maior, a educação do homem.

Adorno e Horkheimer: crítica a uma “cultura racional” e a indústria cultural
Na obra “A Dialética do Esclarecimento” trazem uma crítica que toda a nossa estrutura social é fundamentada em um ideal que se supervaloriza o racional. E o sensível é considerado como não-científico. A dialética é um movimento onde há dois elementos. o mito e o esclarecimento. O Iluminismo buscava um desenvolver da sociedade racional. Quando o homem tentou a superação do mito acabou recaindo em novo mito. Desta vez toda a cultura que enfatiza aquilo que é científico acabou por levar a arte como algo inútil, pois não há ciência na arte. Entretanto a arte continuou existindo e com o consumo mercantil da arte, esta se tornou um objeto dentro da, chamada pelos filósofos alemães, “indústria cultural”. Nela a arte e os bens culturais são submetidos a prática do capitalismo. Logo por elas estão sendo vendidas os ideais dominantes do capitalismo. Para eles assim como para Schiller a arte não pode estar submetida ao mercado.


40 minutos: Construção conceitual

Dá se as palavras para que o mapa conceitual seja montado: educação; ética; belo; arte; obra de arte; estética.
Voltam-se a mais questões para a construção conceitual que será elaborada de forma individual. Assim cada aluno pode mostrar suas ideias de ligações entre os conceitos e suas ideias de estruturas. É pertinente que cada aluno explicite o porquê de cada ligação, pois no próximo momento esta explicação será um argumento. Dá-se em torno de dez a quinze minutos para esta elaboração.
Após a construção individual dos mapas conceituais de forma individual, no quadro começa um novo mapa. Neste novo mapa (construído a partir dos mapas confeccionados pelos estudantes) permite discussões sobre as ligações conceituais. Para a oficina ser realizada de forma mais proveitosa deve possibilitar que os debates sejam sustentados pelos participantes. Deste modo a construção coletiva no quadro negro possibilita uma série de debates e construções que engrandecem a atividade. Ao fim da oficina, para o encerramento da atividade, é possível que seja posto em um painel o mapa conceitual com as ideia estruturadas pelos participantes da oficina.

Cabe ao ministrante ajudar na construção, mostrando possíveis falhas da estrutura e instigando como se estabeleceria cada relação por eles pretendida.
Algumas questões podem ser retomadas para que estimule um início dos mapas conceituais. Ou novas questões podem ser postas: Podemos pensar em qual a importância da arte para a formação de um indivíduo? Mas o que é arte mesmo? E o que é uma “obra de arte”? Há diferença? Qual? É possível que o “belo” seja universalizado? Onde está aquilo que estipulamos como “belo” no indivíduo, no objeto ou na experiência?
Algo que pode ser feito é instigar os participantes que olhem de novo as reproduções das obras trazidas para repensarem as relações com a arte.


Referências

ADORNO, T.; HORKHEIMER, M. A Dialética do Esclarecimento. Rio de Janeiro. Jorge Zahar. 1985.

COTRIM, Gilberto e FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filosofia. 2 Ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

JIMENEZ, M. O que é estética? São Leopoldo. Editora Unisinos. 2000. 413 p.

HERMANN, Nadja. Ética e estética: a relação quase esquecida. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005. 119 p. (Filosofia; 193)

NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. O nascimento da tragédia ou Grécia e pessimismo: texto integral. São Paulo: Escala, 2007. 172 p.

SCHILLER, Johann Christoph Friedrich. A educação estética do homem: numa série de cartas. 4.ed. São Paulo: Iluminuras, 2002. 158 p.

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