Oficina sobre Hans Jonas: O Princípio Responsabilidade

Ementa: Com a tecnologia avançando cada vez mais o ideal de felicidade está cada vez mais próximo? Ou este "avanço tecnológico" poderá acabar com a integridade humana?

Objetivo: Refletir sobre a proposta de responsabilidade que o autor Han Jonas coloca como um ensaio de uma nova ética para a civilização tecnológica.

Disciplina: Filosofia.
Nível de ensino: Médio.
Problema Filosófico: Por que é necessário uma nova ética? Quais as consequências já existentes da tecnologia? E quais as possíveis futuras consequências?
Tema da unidade: Ética e Tecnologia.
Período de execução do plano: 2 horas.
Autores: Everton Luis Ferri e Mateus Maciel

Planejamento:

Nos 10 minutos iniciais será apresentado o autor Hans Jonas:

  • Nasceu em 1903 na Alemanha (Monchengladblack);
  • Origem Judaica - Leitura dos profetas Hebreus;
  • 1921 - Recém formado frequenta a universidade de Freiburg e tem aulas com Martin Heidegger;
  • 1924 - Heidegger se transfere para a universidade de Marburg e Hans Jonas encantado pelas suas aulas o acompanha;
  • Lá conhece Rudolf Bultmann teólogo alemão que o ajuda como seu orientador a elaborar sua tese sobre a gnose no cristianismo primitivo que é apresentada em 1931;
Escreveu abundantemente sobre o Gnosticismo¹, pelo que é igualmente conhecido, interpretando a religião como um ponto de vista existencial filosófico. Jonas foi o primeiro autor a escrever uma história detalhada do antigo gnosticismo. Além disso, foi um dos primeiros autores a relacioná-lo com questões éticas nas ciências naturais.

¹Gnosticismo: Qualquer conhecimento mistico das verdades divinas e transcendentes que se referem à condição espiritual do ser humano.
  • 1934 deixa a Alemanha por causa do nazismo;
  • 1966 - Publica the phenomenon life, toward a philosophical biology referente aos seus estudos de Darwin, trabalha agora com questões biológicas;
"O fenômeno da Vida" tenta sintetizar a filosofia da matéria com a filosofia da mente, produzindo um rico entendimento da biologia, em busca de uma natureza humana material e moral.

  • 1979 - Faz uma síntese de seus estudos e publica "O Princípio Responsabilidade Ensaio de uma ética para a civilização tecnológica".
Seu trabalho concentra-se nos problemas éticos sociais criados pela tecnologia. Jonas quer sustentar que a sobrevivência humana depende de nossos esforços para cuidar do nosso planeta e seu futuro. Formulou um novo e característico princípio moral supremo: " Atuar de forma que os efeitos de suas ações sem compatíveis com a permanência de uma vida humana genuína."

  • 1993 vem a falecer;
10 minutos seguintes é feito uma contextualização:

 É necessário estabelecer o plano de fundo contemporâneo do autor, tanto dos acontecimentos históricos, quanto da situação em que o pensamento ocidental se encontrava. Começando pelos fatos históricos, o “avanço tecnológico” foi o mais marcante da humanidade nesse período. Faz-se de extrema importância estudar o conceito de técnica para explicar o fato do “avanço tecnológico”. No passado a técnica sempre foi um tributo cobrado pela necessidade, através dela foram se aprimorando todos os tipos de procedimentos necessários para a sobrevivência. Quando utilizado o termo tecnologia pretende-se falar do campo de estudo das técnicas e, portanto a ideia de “avanço tecnológico” remete ao aprimoramento dos estudos técnicos de sobrevivência.
 Os séculos XVIII, IX e XX ficaram marcados pelas revoluções industriais que estão fortemente ligadas a essa ideia de avanço tecnológico, pois agora a indústria mecânica da qual evoluiu de procedimentos antigos, permite um aumento de produção do que é necessário para a sobrevivência.  Isso sem falar na demanda comercial em função do consumo, que em consequência de uma superpopulação aumentava cada vez mais. Logicamente uma coisa esta ligada a outra, superpopulação exige uma superprodução.
 Além desse processo de desenvolvimento tecnológico, o pensamento Ocidental também se modifica em suas bases fundamentais, alterando um pilar da filosofia definido como metafísica. Mais precisamente não se quer alterar, mas sim acabar, romper esse vinculo moderno com a metafísica da subjetividade.
 A filosofia moderna atingiu um potencial racional muito grande, o conceito de universalidade e consciência universal foi apresentado sob uma lógica perfeita, e garantiu um reconhecimento importante na historia da filosofia. Talvez isso tenha influenciado os avanços tecnológicos, mas não cabe aqui nessa apresentação explicar se isso aconteceu de fato ou se é só uma coincidência no quadro cronológico. O fato é que, no campo de estudo que trabalha com a metafísica, se discute questões improváveis, ou seja, diferente da ciência que através de demonstrações práticas consegue provar os seus conhecimentos, a metafísica estuda o que esta além da dimensão física. A ética sempre foi um estudo da filosofia e os seus pressupostos sempre estiveram no campo da metafísica, pois em lugar nenhum no mundo físico se encontra o motivo que impunha o modo como se convive com as outras pessoas. Mas isso não impede que através do raciocínio lógico se busque imperativos morais para conviver em harmonia.
 A ruptura com a metafísica do período contemporâneo se deu principalmente por um filósofo alemão chamado Friedrich Nietzsche que deixou feridas abertas na ética tradicional, ao denunciar o modo como a dimensão apolínia (razão) suplantou a dionisíaca (emoção). As falas de Nietsche sobre a morte de Deus, o crepúsculo dos ídolos e a conhecida filosofia do martelo, refutam os argumentos metafísicos da modernidade e de toda filosofia tradicional. A ideia de que através de um esforço moral subjetivo é possível acessar uma consciência universal, deixava agora uma impressão negativa de controle sobre a sociedade. Para Nietzsche a sociedade precisava se libertar das amarras que bloqueavam as suas vontades artísticas e genuínas, em detrimento a uma razão moral imposta por uma consciência universal.
 É lógico que a filosofia não muda por causa de um filosofo só, além de Nietzsche, outros pensadores e novas correntes como a psicanálise e o giro linguístico criticam a teoria da subjetividade concebida como autodeterminação individual.
 Resumindo, o pensamento contemporâneo destacasse pela insuficiência dos argumentos filosóficos tradicionais que abordam a ética, e é aqui que se encontra a porta de entrada para Hans Jonas e sua ética da responsabilidade.

20 minutos para apresentação conceitual proposta pelo autor:

No começo de sua obra Hans Jonas aborda os problemas de querer reproduzir uma ética que tenha um teor universal, destaca como toda ética sempre possuiu um valor hipotético sobre acessar uma consciência universal através de um esforço moral. Quando tratamos de ética estamos falando do agir humano, o autor alerta para o poder que este agir humano tem sobre a natureza agora com o avanço tecnológico.

 “Decerto que as antigas prescrições da ética ”do próximo” – as prescrições da justiça, da misericórdia, da honradez etc. – ainda são validas, em sua imediaticidade intima, para a esfera mais próxima, quotidiana, da interação humana. Mas essa esfera torna-se ensombrecida pelo crescente domínio do fazer coletivo, no qual ator, ação e efeito não são mais os mesmos da esfera próxima. Isso impõe à ética, pela enormidade de suas forças, uma nova dimensão, nunca antes sonhada, de responsabilidade”. (JONAS, 2006. p. 39).

É necessário uma nova ética que se adapte com o avanço tecnológico e o poder que os conceitos de “liberdade” e “subjetividade” têm após essa ruptura com a metafísica. Sendo assim Hans Jonas é um crítico da época que nos propõem o princípio da responsabilidade, responsabilidade essa que sempre esteve presente em todo pensamento ético, porém agora toma lugar de centralidade sendo ela a base de toda nova ética a ser desenvolvida. Essa nova ética não se fundamenta mais em algo hipotético como o imperativo categórico de Kant: “Age de tal maneira que o princípio da tua ação se transforme numa lei universal”. O novo imperativo não tem fundamento, ele preserva pura e simplesmente a existência humana, esta por sua vez exige um dever de direito previsto em potência nas próximas gerações, por isso reestabelece um novo imperativo:

 - “Age de tal maneira que os efeitos de tua ação sejam compatíveis com a permanência de uma vida humana autentica”, ou formulado negativamente, “não ponhas em perigo a continuidade indefinida da humanidade na Terra”. (JONAS, 2006. p. 18)

Hans Jonas não está pensando mais como a filosofia ate então se propunha a pensar, em uma busca somente da “melhora” do ser, mas necessariamente uma busca por algo que permita existir algum ser para poder se melhorar.

“Nenhuma ética anterior vira-se obrigada a considerar a condição global da vida humana e o futuro distante, inclusive a existência da espécie. O fato de que hoje eles estejam em jogo exige, numa palavra, uma nova concepção de direitos e deveres, para a qual nenhuma ética e metafisica antiga pode sequer oferecer princípios, quanto mais uma doutrina acabada.” (JONAS, 2006. p. 41).

 Agora essa ética deve ter um princípio que não se detenha só na busca da felicidade, mas também no medo da extinção humana que consequentemente clama por um respeito pela natureza. Entretanto esse medo não se refere ao medo que acovarda, mas sim em um temor que inspira coragem de tomar as rédeas e assumir a responsabilidade. Uma responsabilidade com a vida, pelo simples fato de que sempre existiu vida na natureza independente da escolha do ser humano.

HEURÍSTICA DO MEDO

Não exclui, portanto a importância de ter esperança, porém ela vem depois do medo, seria uma atitude irresponsável colocar a integridade humana em jogo pela possibilidade de acertar na felicidade. Como em um jogo de tiro ao alvo é muito fácil perceber que o acerto é sempre menos provável que o erro, se colocar a vida humana em uma aposta de tudo ou nada a maior probabilidade é a de extermínio, e isso seria uma irresponsabilidade. Além disso, o bem esta sempre sujeito a divergência de opiniões e diferente deste ultimo, o mau, quando se apresenta não causa dúvida alguma de que seja mau.

Pois assim se dão as coisas conosco: o reconhecimento do mau é infinitamente mais fácil do que o do bom; é mais imediato, mais urgente, bem menos exposto a diferença de opinião; acima de tudo, ele não é procurado: o mal nos impõe a sua simples presença, enquanto o bem pode ficar discretamente ali e continuar desconhecido. [...] Não duvidamos do mal quando com ele nos deparamos; mas só temos certeza do bem, no mais das vezes, quando dele nos desviamos. (JONAS, 2006. p. 71)

RESPONSABILIDADE PARENTAL E RESPONSABILIDADE POLÍTICA

A responsabilidade que um candidato político deve ter para com o seu povo tem que ter a mesma obrigação que um pai tem com o seu filho, ou seja, o pai deve deliberar para reproduzir, assim como o candidato para se eleger. Ambos devem ter noção da responsabilidade de suas ações, essa noção é o princípio da responsabilidade. Mas isso não quer dizer que somente nesses dois casos deve haver responsabilidade, nessa parte da sua argumentação Hans Jonas está preocupado com os sistemas políticos e quer salientar como essa disposição requer a mais genuína das responsabilidades, a saber, a de um pai para com o seu filho.

Para a responsabilidade parental, que do ponto de vista temporal e de sua essência constitui o arquétipo de qualquer responsabilidade (e, além disso, na minha opinião, é geneticamente a origem de toda a disposição para a responsabilidade, ou seja, a sua escola fundamental), a questão da totalidade é evidente. Seu objeto é a criança como um todo e todas as suas possibilidades, e não só as suas carências imediatas. [...] Em uma palavra: o cuidado parental visa à pura existência da criança e, em seguida, visa a fazer da criança o melhor dos seres. [...] Essas são também as preocupações do verdadeiro homem publico. [...] Mesmo a usurpação traz, junto com o poder, a responsabilidade; e a conquista do poder para assumir a responsabilidade pode ser o motivo do golpe de estado. (JONAS, 2006. p.180)

 Nos séculos passados a ética tradicional sempre lidou com uma moral que decorre da convivência entre sujeitos da mesma espécie, moral esta necessária de ser pensada dentro dos limites naturais, de onde o ser humano não podia afetar a integridade de suas origens. Este período contemporâneo inaugurou uma “terra de ninguém” por causa da subjetividade e os avanços tecnológicos que permitem o ser humano exterminar com toda natureza que o gerou.

A proteção do patrimônio em sua exigência de permanecer semelhante ao que ele é, ou seja, protegê-lo da degradação, é tarefa de cada minuto; não permitir nenhuma interrupção nessa tarefa é a melhor garantia de sua duração; se ela não é uma garantia, pelo menos é o pressuposto da integridade futura da “imagem e semelhança”. Mas sua integridade não é nada mais do que a manifestação do seu apelo à humildade, [...]. Guardar intacto tal patrimônio contra os perigos do tempo e contra a ação dos homens não é um fim utópico, mas tampouco se trata de um fim tão humilde. Trata-se de assumir a responsabilidade pelo futuro do homem. (JONAS, 2006. p. 353)

Não cabe aqui decidir qual ética trará a felicidade plena, mas sim qual ética ira proteger o ser humano do seu próprio agir em busca dessa felicidade plena. Hans Jonas em seus últimos capítulos explora a utopia Marxista e faz inúmeras criticas demonstrando a insuficiência prática da realização utópica. Porem afirma que esse capitalismo abusivo da sociedade atual está levando a um sistema cada vez mais comunista, não pelo desejo ideal, mas pela filosofia de divisão dos recursos adquiridos da natureza, que possivelmente com um elevado numero de indivíduos presentes no planeta, poderá se esgotar.

O problema de como alimentar a crescente população mundial vem naturalmente em primeiro lugar, pois dele depende tudo o mais. [...] Mesmo sem utopia, a magnitude atual da população planetária já requer, e seu crescimento inevitável no futuro próximo (uma ou duas gerações) certamente exigirá mais ainda, o emprego maciço de fertilizantes artificiais festejados por Bloch, que “encorajam” o solo a multiplicar os seus frutos. Ou seja, por causa do êxito biológico e do seu crescimento irresistível, a humanidade se vê forçada a adicionar produtos químicos à camada produtiva da crosta terrestre, conseguindo com isso apenas garantir a subsistência atual, um quadro que não é nada tranquilizador. (JONAS, 2006. p. 302)

O princípio responsabilidade é baseado no temor pelo pior e na intensidade do agir de um pai responsável para com o seu filho. Não se fundamenta em algo metafísico que esta a priori da existência, mas que por haver vida, ou seja, existência (e esta nunca esteve em um perigo de destruição tão grave quanto agora) necessita-se de uma responsabilidade maior.
Inseminação artificial, manipulação genética, controle de comportamento, tratamentos químicos na agricultura, criação de animais em cativeiro para produção massiva de carne e questões da diminuição de natalidade e da mortalidade são questões levantadas pelo autor na presente obra, estas trazem dúvidas quanto à integridade da vida natural. Por isso indico essa leitura a todo público interessado em buscar meios de preservação da vida natural no planeta Terra, e em ter  responsabilidade com todo o meio ambiente.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

JONAS, Hans. O principio responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização tecnológica (1979). Tradução original alemão Marijane Lisboa, Luiz Barros Montez. – Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC rio, 2006.

Próximos 60 minutos:

Será proposto aos alunos assistirem um episódio da série Black Mirror, que contém reflexões éticas a respeito da tecnologia.

Nome do episódio: Engenharia reversa.
Tema do episódio: Eugenia.
Duração do episódio: 60 minutos.

Nos 20 minutos finais os alunos expressarão suas posições a respeitos dos temas tratados em aula e conforme será solicitado realizarão uma conexão entre os problemas da tecnologia e o episódio da série Black Mirror.


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